segunda-feira, 23 de junho de 2014

Vivino

Há várias aplicações sobre vinho surgindo para uso em telefones celulares inteligentes (smart phones) e computadores do tipo tablet. Normalmente elas combinam funções de armazenamento de dados sobre as características de vinhos, uvas e vinícolas, lista dos vinhos da adega de uma pessoa e redes sociais, que permitem a troca de informação entre os usuários da aplicação, ainda que de forma limitada. Uma dessas aplicações para celulares chama-se Vivino e tem uma versão de entrada gratuita e outra profissional paga. Acho que é uma das mais populares pela facilidade de ler os dados principais do vinho, tais como nome, vinícola, uva, safra, graduação alcoólica e região, a partir do de uma foto do rótulo da garrafa. Esses dados podem ser depois corrigidos manualmente se necessário.

É possível também fazer comentários sobre o vinho e dar uma nota de 0 a 5, variando de 0,5 a 0,5, que gera uma média de todas as notas.  Esta nota de 0 a 5 é um fator de limitação e diferente de outras escalas que existem no mundo do vinho, como a de R. Parker (0 a 100). Essas notas são usadas por muitas pessoas como um indicador da qualidade do vinho. Eis o que diz a Folha de São Paulo sobre o Vivino: “Você vai ao mercado e não sabe qual vinho comprar. Seus problemas acabaram: tire uma foto do rótulo e poste no app que vai te ajudar com dicas sobres as melhores bebidas para seu gosto e bolso”.

A própria questão de atribuir uma nota a um vinho não tem sido completamente aceita pelos apreciadores de vinho, com a alegação que reduzir a análise das várias características que forma a personalidade de um vinho a uma simples nota é um número em uma escala é um elemento redutor muito grande, é quase um sacrilégio. Quando essa nota é dada por pessoas desconhecidas e provavelmente não muito conhecedoras de vinho, como os usuários do Vivino, esta questão surge mais forte: quão confiável é essa média. Muitos blogueiros de vinhos têm escrito comentários negativos com relação a isso.

Naturalmente, há alguns pontos a considerar. O primeiro, a meu ver, é a estatística. A média de um vinho que teve apenas duas ou três avaliações não é confiável e pode até mesmo ser manipulada. Agora, se um vinho teve centenas de avaliações, como alguns vinhos mais populares, então penso que é possível ter certo grau de confiança na média produzida. Somando-se a nota aos comentários de outros avaliadores, aos próprios conhecimentos, ao preço etc, é possível ter uma boa noção da qualidade do produto.

O segundo ponto a considerar está relacionado ao conceito que em inglês escreve-se “wisdom of the crowds”, que pode ser traduzido livremente por “sabedoria das multidões”. Esse conceito é usado em muitas aplicações que usam a opinião dos usuários para dar uma nota a algum tipo de serviço, como restaurantes, hotéis e locadoras de carro. Vejam por exemplo aplicações como booking.com e tripadvisor.com. Aceita-se que a melhor forma de avaliar vem dos usuários, que não necessariamente precisam ser especialistas no assunto. Com um número suficientemente grande de amostra, acredita-se que a média das opiniões convergirá para o que seria a média das opiniões de especialistas.


 Como tudo na vida, a realidade é geralmente mais complexa do que a retratada pelos algoritmos da aplicação. O que fazer se ao abrir o vinho, a garrafa estiver estragada por má conservação? O usuário deve dar uma nota baixa ou deveria abster-se de dar uma nota nessa situação? Ou então, considerado um vinho jovem que deveria ser consumido em um ano depois de entrar em comercialização. Usemos como exemplo um Beaujolais. Alguém que não conhece esse detalhe guarda uma garrafa por três anos em condições não ideais de conservação e depois abre. Encontra um vinho passado e chocho e dá uma nota baixa. O vinho deveria pagar pelo desconhecimento do consumidor? 

domingo, 22 de junho de 2014

Essas máquinas maravilhosas que servem vinho.

Surgiram recentemente as máquinas “vinomatic”. As garrafas, geralmente oito, são abertas e  recebem um pequena mangueira que vai até o fundo. A garrafa é mantida sem contato com oxigênio por meio da injeção de um gás inerte, o nitrogênio. Para se servirem, os próprios os clientes apertam um botão para dispensar doses de 30,  60 ou 120ml. As proliferam em bares pelo mundo. O conceito é interessante, pois permite que o vinho seja vendido em doses, sem que o vinho restante na garrafa se deteriore. É possível também manter uma grande quantidade de garrafas abertas ao mesmo tempo, o que não é possível nos bares e restaurantes tradicionais.  Na foto abaixo mostro uma máquina que encontrei em um bar no centro de Bordeaux que serve alguns dos grandes ícones da região. Custa 25 euros cada dose de 30ml.  


Novos bares estão surgindo nas grandes cidades do mundo que giram em torno dessas máquinas. Em São Paulo surgiu o Bardegas, com doze máquinas desse tipo e uma grande seleção de vinhos, com preços variados. Há algumas semanas fui a esse bar para conhecer o conceito e o cardápio que acompanha os vinhos. Eu aproveitei par experimentar uma dose de Pera Manca. Enquanto esperava o vinho abrir um pouco no copo e notei vários grupos de jovens que se serviam constantemente de novas doses. O problema que percebi é que o bar estava lotado e a as mesas e cadeiras não são confortáveis o suficiente para se ficar muito tempo. Portanto, não havia clima para aguardar pelo menos trinta minutos o vinho abrir no copo.  A ideia é bem vinda e interessante, mas da forma como foi implementada no Bardegas,  meu conselho é que sejam consumidos os vinhos mais jovens e mais baratos, que podem ser degustados logo após servidos.    


terça-feira, 22 de outubro de 2013

Vinho de Supermercado - Gomellano

Gomellano é o gentílico de uma cidadezinha  ao norte de Madrid, na região de Burgos:  Gumiel de Mercado,  onde o vinho foi produzido.  Mais precisamente, ele é produzido com uvas da propriedade denominada  Real Sitio de Ventosilla, que já foi hospedagem dos reis de Espanha e hoje abriga a Vinícola PradoRey, produtora do famoso vinho homônimo. O sitio margeia o rio Duero e está incluído na D.O.C Ribeira del Duero.  Curiosamente, a única informação do contrarrótulo é o nome dessa propriedade e no site da Vinícola não há menção alguma ao vinho. Ele é vendido pelo Carrefour e algumas garrafas foram trazidas para o Brasil há alguns anos.É também vendido pelo Carrefour na Europa, especialmente na Espanha, mas apenas em algumas safras.

Eu comprei uma garrafa em novembro de 2009, do tipo Crianza, safra de 2003, Tempranillo, em uma promoção por R$16 a garrafa. Quando tomei o vinho, fiquei impressionado pela boa qualidade a um preço tão baixo. Fiz uma extensa pesquisa na Web e encontrei o comentário de um blogueiro que também havia comprado no Carrefour e não havia gostado, mas ele havia experimentado um Cosecha. O comentário existe até hoje:  http://vivinhos.blogspot.com.br/2010/07/gomellano-ribera-del-duero-espanha.html . Na Web havai  muito poucas informações sobre o vinho,  e concluí que se tratava de um vinho engarrafado por essa vinícola PradoRey, provavelmente de uma safra ruim, ou de algum vinhedo com videiras mais novas, especialmente para ser vendido no Carrefour. Um filho bastardo, que se esconde até onde possível. Voltei à mesma loja dois ou três meses depois e encontrei mais cinco garrafas, comprei, dei uma para a minha filha  e  guardei as outras, para tomar uma por ano.

Encontrei um comentário sobre o vinho em um site espanhol algum tempo depois. O comentarista comentava sobre vinhos de supermercados – que ele chamou de vinhos com marca “branca” – , dizendo que alguns deles podem ter boa proveniência, e dava 88 pontos a este Gomellano Crianza 2003, em postagem de 15/02/2009 (http://www.verema.com/foros/foro-vino/temas/573761-marcas-blancas-vinos?page=3):

“En la revista Sibaritas, dirigida por José Peñín, suele haber una página muy interesante denominada Los Vinos de Supermercado donde pone nota a una serie de vinos de marca blanca de las grandes superficies y grandes almacenes, mencionando la bodega productora. En lo que se refiere a Carrefour ahí van algunos ejemplos: El citado Valdoscardos es de Bodegas Frutos Villar (cuyos vinos de Toro son los Muruve) y Peñín les da una nota de 86 al tinto 2006 y 88 al crianza 2003. Los Gomellano de Ribera del Duero que se encuentran en sus establecimientos son de las Bodegas Real Sitio de Ventosilla (Prado Rey) con un 88 para su crianza 2003; yo lo he probado y está muy bien.”

Em 2009 eu também daria 88 pontos para este vinho. Nos anos seguintes eu abri uma garrafa a cada ano e o vinho continuou praticamente com a mesma qualidade. Hoje eu abri a última e o resultado foi decepcionante: aroma com pouquíssima intensidade e de baixa qualidade – lembrando um aroma que um amigo define como de “uva cozida”, que já encontrei em vários vinhos, –  halo bastante pronunciado e cor vermelho-atijolada. A entrada de boca lembrava ainda um vinho de boa qualidade, com notas de cereja e uma oxidação ainda prazerosa, mas era logo seguida por um desconforto nas papilas e um amargor acentuado. Depois de aerar por cerca de 30min, só piorou.  A nota hoje seria muito mais baixa, ao redor de 75.  Claramente um vinho que atingiu seu ápice e entrou em decadência. Considerando outras experiências, os vinhos espanhóis do tipo Crianza parecem atingir seu ápice em cerca de sete ou oito anos.





segunda-feira, 7 de outubro de 2013

O vinho do reitor

Os estudantes que ocuparam a reitoria da Unicamp encontraram uma caixa de vinho Coeur de Méditerranée,  um corte das uvas Merlot e Grenache, na sala do reitor, segundo informam. Vejam a notícia em:
http://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/2013/10/dce-cobra-explicacao-da-unicamp-apos-achar-vinhos-na-sala-do-reitor.html .

Na fachada do prédio da reitoria há um enorme cartaz irônico com os dizeres "Venha conhecer a adega do reitor!!!!, saída do bandejão às 13h30". A caixa foi fotografada e a foto enviada para a imprensa; está também no Facebook, no site "ocupação reitoria 2013". A reitoria teve que se justificar e informou que se trata de uma compra de um grupo de funcionários que iria consumir os vinhos em uma festa a ser realizada fora do campus, mas por motivo de segurança deixaram a caixa guardada na reitoria. Os estudantes invadiram antes do consumo e fizeram a sua  própria festa, com a "adega" de vinhos franceses do reitor.

A justificativa da reitoria parece um tanto esfarrapada, mas é difícil acreditar que o reitor da Unicamp fosse servir esse vinho em alguma recepção oficial ou coisa parecida. Se fosse essa a intenção, teria sido uma péssima escolha. O vinho é bem básico e custa no Brasil entre 30 e 40 reais, na França entre 3 e 4 euros. É um "vin de pays", uma categoria básica inferior à A.O.C. e da região de Languedoc-Roussillon, que não tem tradição de produzir bons vinhos. É quase impossível comprar um vinho Francês razoável por esse preço.

domingo, 4 de agosto de 2013

Cabernet Sauvignon adocicado

Uma amiga minha comentou há algum tempo que gostava de um vinho chamado Altue. Ontem nos encontramos em um jantar e ele me disse que encontrou no Carrefour em São Paulo e comprou duas caixas. Resolvi experimentar. O rótulo indicava ser um Cabernet Sauvignon. Resolvi ver o contrarrótulo e encontrei duas curiosidades (ver a foto).  Primeiro, diz que se trata de um vinho “de assemblagem”, em evidente conflito com a a informação do rótulo de que se trata de um varietal. Tem-se aí um importador que não faz direito seu dever de casa. A segunda informação é que se trata de um “vinho tinto de mesa suave fino”.  A princípio não entendi bem o que significava, pois o termo “vinho fino” é usado no Brasil com a conotação de vinho feito com vitis vinífera e o termo “vinho suave” quando é feito com “vitis americana”.  Em seguida experimentei o vinho e entendi o significado da frase e porque minha amiga gostou do vinho: ele é bem adocicado. Não há informação no contrarrótulo sobre o grau de acuçar no vinho, mas estimo que seja relativamente alto,  em torno de  30 a 40 g/l.  

Mais tarde em casa, procurei pelo vinho na Web. Ele é produzído por uma vinícola no vale central chamada Cremaschi Furlotti. No site da vinícola não aparecem os vinhos da marca Altue e não consegui encontrar sua ficha técnica. A vinícola está localizada no vale de Maule, próxima à cidade de Talca. Nas lojas do Carrefour há outras variedades desse vinho na modalidade “seco” e feito com outras uvas. No aplicativo Vivino, a safra 2012 desse vinho tem pontuação 2.5 (de 1 a 5), que me pareceu muito generosa. Os comentários no Vivino e em blogs são variados. Algumas pessoas dizem que gostaram por ser adocicado (principalmente mulheres), outras dizem  que é ruim, que só serve para fazer sagu, que não serve nem para culinária etc.

É difícil entender porque usar Cabernet Sauvignon para fazer vinho adocicado e ainda mais porque importá-lo para o Brasil.



terça-feira, 23 de julho de 2013

Mouton Cadet Réserve Médoc

Comprei esta garrafa de Mouton Cadet Réserve na loja duty free do aeroporto de Guarulhos. O preço na época foi de 55 reais. Em dólares o valor foi 29. Trata-se de um vinho da AOC Médoc, um  típico corte bordalês: cabernet sauvignon (50%), merlot (45%) e cabernet franc (5%). O teor alcoólico é de 14% e a safra é 2010. O vinho é uma marca criada pelo Barão de Rothshild e tem algumas variações: Graves, Saint-Emillion e Sauternes com preços diferentes, o que pode causar confusão. O tempo de envelhecimento em barríl de carvalho foi de doze meses e estima-se que o tempo de guarda previsto situa-se entre seis a oito anos.

O vinho tem cor rubi intensa  e aroma discreto, com baixa intensidade. Tem sabor de frutas vermelhas e maduras com notas de baunilhas bem integradas. Na boca, mostrou-se um pouco áspero e desequilibrado, com acidez predominando. Corpo médio. No final de boca um pouco de amargor e baixa persistência, de menos de 1 ou 2 segundos. É possível que com mais alguns anos de envelhecimento na garrafa possa mostrar-se melhor, mas no momento, com três anos, é um vinho apenas razoável,  com custo-benefício muito ruim. Minha nota é 83.

domingo, 21 de julho de 2013

Cartas de vinho defeituosas

Já vi muitos restaurantes com cartas de vinho defeituosas e pouco informativas. O mais comum é não constar o ano da safra ou a uva. Recentemente estive em um resort do nordeste brasileiro e encontrei um menu muito mal cuidado, com falhas grotescas, de forma alguma compatível com o nível do estabelecimento.
Notem no exemplo abaixo que os vinhos tintos italianos têm sua origem remetida para os vales do Chile. Além disso, percebam as grafias incorretas das palavras Umbria e Chianti. Eles precisam urgentemente de um bom sommelier, ou pelo menos pedir para algum conhecedor de vinhos revisar a carta.